Um som pegado, um fungado constante de cangote, com um arrastado de chinela e passagem por grandes festivais em todo Brasil, Forró Red Light vem conquistado destaque no cenário da música eletrônica. O duo nascido em Brasília, formado por Ramiro Galas e Geninho Nacanoa, mistura ritmos nordestinos com beats eletrônicos.
O projeto de Live PA – técnica em que se toca a música eletrônica em tempo real, tem suas apresentações construídas em cima de reinterpretações de clássicos do forro, xote e frevo, sempre com uma pegada eletrônica e uma assinatura própria.
Estar na pista deles é ser convidado pra dançar um arrasta-pé do futuro, com um som pegado e um fungado constante de cangote. As músicas autorais também animam esse forró pra “dançar agarradinho”, as bases eletrônicas e samples engrossam essa mistura.
Pra conhecer melhor o FRL, que está na estrada desde 2015, entrevistamos os caras e o resultado dessa conversa você pode conferir a seguir.
Tuntistun: É um prazer enorme falar com vocês, pra começarmos quero saber, de quem é esse jegue? Fale um pouco sobre vocês.
Ramiro: Um jovem brasileiro apaixonado pelos meios eletrônicos de música e arte. Nascido em Teresina-PI, é formado em Letras e mestre pelo Programa de Pós-Graduação Música em Contexto da Universidade de Brasília. Publicou diversos artigos sobre a cultura DJ, o uso do sample como ferramenta de criação e o papel das redes sociais na circulação musical. Sua dissertação investiga os novos paradigmas de produção, circulação e consumo no contexto da cultura DJ mediada pelas tecnologias virtuais. Como produtor de música eletrônica, participou da trilha sonora de espetáculos cênicos, curtas e longa-metragens; e se apresentou em diversos festivais de música do Brasil. Ministra cursos e oficinas diversas sobre produção de música eletrônica. Em 2013, foi vencedor do Festival Candango Cantador na categoria Melhor Produção Original de Música Eletrônica. Em 2017, foi premiado na categoria Melhor Trilha Sonora na Mostra Brasília do 50º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Geninho: Eu sou Geninho Nacanoa. Produtor Musical, pesquisador em cultura popular e etnomusicologia, percussionista. Bibliotecário de formação, músico de coração. Idealizador da ÎaNDé RadiOLa dOS POvOS, Forró RED Light, do Unos Coletivo e do Festival Kultur, entre outros projetos e vibrações positivas. Aqui no DF, como integrante do grupo HaONO por mais de 10 anos, trouxe grande bagagem de vivência de arte e de invenção e reinvenções musicais. Com imersões na cultura indígena, na construção de instrumentos musicais com materiais reciclados e em diversidade cultural. Com o Unos Coletivo, realizamos diversos eventos de interações estéticas, intercâmbio cultural Brasil-África e diálogo da cultura urbana de rua com a universidade e revitalização de espaços culturais ociosos do DF. Nas periferias, realizamos trabalhos e parcerias continuadas com Tamnoá no Paranoá, Mulheres do Sol Nascente no Sol Nascente e Arte na Quebrada no Recanto das Emas, entre outros. Em estúdio, o foco esse ano é a finalização de uma coletânea com artistas do DF do Forró RED Light, o álbum solo Nuar e a coletânea Yatsetsõ Dowá Kletxhiá, de músicas indígenas do povo Fulni-ô pela ÎaNDé RadiOLa dOS POvOS. E sair vivo e com saúde e podendo colaborar, contribuir com boas energias sonoras nessa Nova Era q se inicia. Namastê! Vibração na Candeiaa! Asè
Como nasceu e qual a proposta do Forró Red Light?
O FRL é antes de tudo um encontro. Dois figuras de diferentes vivências e contextos musicais se juntaram para criar esse som, que se alinha ao que podemos chamar de música eletrônica brasileira. Ramiro vem da pista de dança e da música techno; Geninho, da música orgânica e da cultura popular. Cada um de nós estava buscando novos caminhos musicais, Ramiro queria ir além da música eletrônica e Geninho queria pegar sua bagagem e misturar com o eletrônico, então, não deu outra. Em 2012 começamos a se encontrar e buscar essa sonoridade que hoje é o FRL.
Desde que vi e ouvi me encantei pelo som do forró com as batidas do eletrônico. É forró com eletrônico ou eletrônico com forró? Como surgiu a mistura?
Pode ser forró com eletrônico, pode ser eletrônico com forró, pode ser forrobodó system, pode ser jegue-nave live PA, tudo pode! Bom, estávamos nós, cada um na sua, atentos ao que estaria por vim. Geninho já estava experimentando com beats e loops em uma gig de forró, Ramiro já estava interagindo e começando a trabalhar mais com música brasileira e música orgânica. Pelos corredores da UnB, nos conhecemos e, em algum momento, Geninho falou: “a gente precisa fazer um forró eletrônico”. Ramiro comprou a ideia e daí fomos trabalhando pra dar uma cara e um som a essa mistura.
Alguns anos de estrada, músicas lançadas, histórias e experiências vividas. Do repertorio já lançado, qual a música que mais tiveram trabalho pra finalizar? Já tiveram alguma que a ideia veio e foi finalizada rapidamente ou a que levou menos tempo que as outras?
Rapaz, nesse nosso percurso já aconteceu de tudo. Teve música que saiu em poucas horas de trabalho, algumas estamos fazendo há mais de ano. Nesse quesito acho que quem manda é a música, se ela vem duma vez, dá de produzir em uma sentada, mas se ela vem aos poucos, cada momento um pouquinho, a gente entra na onda e deixa ela curando!
Das viagens e apresentações, qual a mais diferente, aquela que não imaginavam fazer?
A gente deu uma boa rodada no Brasil, conhecendo alguns festivais e algumas casas de show iradas. Mas acho que tocar no Festival Xama, onde a pista de dança era literalmente uma lagoa, foi a mais surpreendente.
Alguma história engraçada?
Engraçada a história é agora que já passou hahaha, mas eu recomendo sempre, sempre, sempre, para qualquer pessoa que está viajando para Rio ou São Paulo, confiram muito bem de qual aeroporto sai seu voo!
Sempre temos experiências boas e ruins, podem citar alguma que foi boa e alguma que não foi tão legal?
Tocar um dia no litoral do Rio Grande do Sul e no dia seguinte no interior do Maranhão marcou pra sempre. Deu de ver o quanto o Brasil é grande e diverso! Foi muita canseira, mas valeu demais a pena! Quer saber de uma bad? Pois toma: a gente toca muito em festas com temática “tropical”, “brasilidades” né… O que sentir quando você está tocando numa festa com esse tema, numa das maiores cidades do Brasil, e na pista de dança não tem uma pessoa preta? Pesado!
Vi em uma outra entrevista que chamam o som de vocês de música eletrônica brasileira. Eu, particularmente, sou encantado com a cultura brasileira, sinto falta e gostaria de ouvir mais nas pistas um pouco mais da cultura do Brasil. Vocês veem outros ritmos brasileiros que podem ser explorados em conjunto com a música eletrônica? Podem indicar outros artistas ou produtores que misturam o ritmo como vocês?
O Brasil é um balaio infinito, cabe tudo e tudo transborda. Há muito tempo arte e cultura nos alimentam, desde antes do achamento do Brasil, então acho que essa capacidade de mistura é infinita. Nós, atualmente, temos o privilégio de vir depois do Modernismo, do Tropicalismo, do Mangue Beat, todos esses movimentos ensinam a cartilha da mistura tradicional + inovação. Não estaríamos aqui sem esses movimentos e sem artistas como Dj Dolores, Chico Science, Chico Correa, Furmiga Dub, Aattooxxa, e mais uma galera que faz esse som hoje, como a Guitarrada das Manas, Waldo Squash, DJ Tahira, Renata Rosa, Forró In the Dark, enfim, tá vendo como é grande esse balaio?
Tivemos lançamento novo e gostaria que falassem um pouco sobre Tropeiros Trópicos. Qual a proposta, ideia, mensagem do álbum?
Tropeiros Trópicos é pensado na conotação na ampliação dos sentidos que ganha a imagética de quem for ver, na linha do Guimarães Rosa. Quando formos dizer Tropeiros Trópicos, vamos lançando no ar a provocação de decodificação dos signos. Na fonética, a ideia é abrir o sentido para a percepção de um trote, do um galope de um cavalo. Na semântica, está embutido o duplo sentido também, podem ser esses tropeiros da região dos Trópicos, um símbolo do sertão da região central, desses Geraes místicos; um povo esquecido em uma região de tantas riquezas em um país reconhecido quase que exclusivamente por suas características litorâneas. Podem ser também os brasileiros de vida simples, de baixa renda. Sem garantias, segurança ou certezas, mas sempre fortes, indo em frente, viajantes em suas vidas de aventureiros, cidadãos sem direitos ou garantias. Mão de obra barata, trabalhadores explorados, cansados, mas resilientes com seus sonhos e sua fé levando a vida e sua tropa. Seguindo… A trilha e seus destinos!
Como descrevem ou caracterizam o som de Piscadinha? Tipo, seria um som mais pra pista ou pra curtir o momento em casa? Qual a história da música? Outra coisa que me chamou bastante atenção foram alguns efeitos sonoros, podem falar sobre isso?
Piscadinha pode ser um forró com eletrônico ou pode ser eletrônico com forró, haha! Foi uma dessas músicas que saiu em uma sentada. Ramiro, em apenas algumas horas, montou a base da música e todo o arranjo, bem nessa pegada “electro hits forró style”, bem pista mesmo! Depois, Geninho colocou o molho e o tempero com alguns efeitos sonoros orgânicos feitos com a própria boca e alguns instrumentos por ele mesmo fabricados.
Sobre o processo de criação, como foi o processo e a experiência de produzir na quarentena?
Bem mais a distância do que o normal! Nosso funcionamento padrão era de se encontrar uma vez por semana, mas com a quarenta isso ficou impossível, mas demos um jeito de nos manter ativos e ativados para conseguir seguir o jegue mesmo cada um em sua casa!
Algo mudou na forma de vocês produzirem neste período pandêmico? Algo continuará nos pós pandemia?
Essa situação de distanciamento social faz a gente ver que, com as tecnologias de hoje, você consegue fazer muita coisa estando cada um na sua casa. Acho que isso vai ficar, o que ainda for melhor fazer a distância, seguiremos fazendo a distância!
O Red Light nasceu dentro da cultura digital, sendo fruto desse contexto musical cercado de home studio e redes sociais. Na percepção de vocês, como essa cultura vem influenciando vocês como artistas e como veem a cena independente atualmente, com toda essa digitalização que a pandemia trouxe?
Somos filhos dessa digitalização! O estúdio se tornou um computador, com samples você pode trabalhar diversos instrumentos legitimamente brasileiros sem necessariamente precisar gravar alguém. O streaming, apesar de polêmico, facilitou uma gestão independente de carreiras e negócios musicais. Acho que muita coisa mudou e estamos no olho de um furação, mas nossa impressão é que as ampliações de possibilidades criativas são boas e vieram para ficar, bem na linha desse momento que criou a gente: chega o novo, o inovador; mas a tradição e o antigo tá sempre ali, presente e guiando!
Sei que os dois tem uma vasta experiência com a música, gostaria que listassem 5 músicas, cada um, que fazem parte da história do FRL e foram trilha em algum momento da dupla. Podem ser autorais ou não.
Playlist Ramiro Galas:
Playlist Geninho Nacanoa:
Aprendemos o tempo todo com todo mundo. O que vale destacar de aprendizado na jornada desse jegue?
O Brasil é gigante; o sertão é um mundo; e vida, o que ela quer da gente é coragem.
Para acompanhar o trabalho do Forró Red Light busque por eles nas redes sociais, clique aqui.