Tonny Rocks: Conta seu percurso na noite
Tonny Rocks é um dos Djs mais importantes da sua geração. Festeiro, pesquisador de música e produtor de várias festas na cidade, hoje comanda a Vapø_r e faz parte do coletivo CCCP. Tonny Rocks conta tudo pra gente hoje!
TUNTISTUN: Grande Tonny, tudo bem? É uma alegria fazer essa entrevista com você que é sem dúvida um dos caras que mais batalharam pela cidade nos últimos 10 anos. Vamos falar um pouco da sua trajetória, beleza?
TONNY ROCKS: Oi, Gui. Claro, vamos falar de tudo que me cabe dizer sim. Adorei o convite.
TUNTISTUN: Vamos falar um pouco do início de tudo? Conte mais sobre você, onde nasceu e como foi sua infância e adolescência?
Eu nasci em SP na Zona Leste pra ser mais exato. Sou filho de um escultor baiano e uma professora brasiliense. Porém logo cedo viemos pra Brasília, então o período da minha infância e adolescência foi entre Ceilândia, P. Sul. Expansão do Setor O e Taguatinga.
TUNTISTUN: Você sempre foi um cara ligado à música desde cedo? Qual sua relação com a música na sua juventude?
Sempre fui apaixonado pela música em geral. Meu pai enquanto trabalhava ou depois de eu assistir Tv Cruj sempre colocava um som pra nós. Era James Brown, Janis Joplin, Prince, Afrika Bambatta, Whodini, 2 Live Crew, Led Zeppelin, Racionais, Terra Samba (risos). A música foi muito importante, ela me ajuda a ter amigos(as), criou memórias boas e ruins sobre a vida. Morar numa periferia traz um olhar diferente sobre a música. Lembro exatamente da música que tocava na rua quando vi uma pessoa ser morta a tiros na minha frente, quando caminhava para a igreja. Lembro dos domingos pela tarde quando o campão ficava cheio de pessoas e o vizinho ouvia Pink Floyd, Tony Garcia fazendo a trilha pra quem passava na rua. A minha mãe também me trouxe uma relação maravilhosa com a música ao me apresentar artistas como Peter Frampton, Bee Gees e a disco music.
TUNTISTUN: Quando e como você descobriu a música eletrônica?
Descobri cedo com CDs do meu pai que tinha C+C Music Factory lá pelos 9 anos. Quando meu pai faleceu, eu tinha 10 anos, então ouvir esses CDs e fitas K7 me traziam conforto e a relação musical foi aumentando. Logo em seguida a Jovem Pan e Transamérica me trouxeram Daft Punk, Chemical Brothers, Prodigy, e uma porrada de artistas incríveis. Mas a relação veio a se tornar forte quando tinha 14/15 anos e ouvi Drum & Bass pela primeira vez. Outras descobertas fortes foram na LOVE, no autódromo, fiquei maravilhado com o som da pista, lembro do Celsāo quebrando tudo na pista de Hip Hop, aproveitar bons momentos no Techno e na pista DNB. Infelizmente apesar de ser de Taguá, durante essa época não criei uma relação próxima com o lendário Laboratório, mas frequentava o espaço.
TUNTISTUN: Quais foram suas primeiras festas e DJs que te abriram os olhos?
Essa pergunta vai passar por bons anos da minha vida. Meu primeiro contato com a cena de fato nāo foi indo a uma festa para curtir. Como não tinha grana, eu topava qualquer trampo pra conseguir juntar dinheiro e ir na Lan House pesquisar música, jogar Counter Strike e acessar MSN. Então meu primeiro contato foi carregando caixas de som da Megamix para a Mansão Ferrugem e nas últimas festas na Embaixada da Bélgica. Na Mansão Ferrugem lembro de ver um DJ tocando Apollo 440 em vinil e ele mixou por uns 2 min sem errar nadinha. Isso me abriu os olhos para um universo sobre o qual ainda não tinha conhecimento. Lembro da primeira vez que fui ao Sub Dulcina na Frenética aos 18 anos, tinha só o dinheiro da entrada, pra uma água e voltar pra casa. Cara, foi paixão de primeira, pela música, pelas pessoas, pela diversidade que vi ali. Lembro também da Electrorockers do Fernando Cunha onde o Komka fez sets incríveis de electro e o Montana de Rock.
Apollo 440 Feat. Beatnuts – Dude Descending A Staircase (Stanton Warriors Vocal Club Mix):
TUNTISTUN: E logo que você gostou da música decidiu ser DJ? Como foi esse caminho?
Gostava de música e colecionava CDs de electroclash, indie, alguns de minimal e house. Comecei a tocar na cena Indie Dance que era verdadeiramente pluralista em gêneros musicais. Tinha crack house, maximal, nu disco, indie, dance pop, tudo misturado numa noite. Em 2007 fiz a minha 1ª festa produzida por mim, a Athena da Belzebaile e o Kleber Rocker, o nome era “Undergroud & Orgastic Fest” – nome ruim (risos), eu sei. Tínhamos entre 16 a 18 anos, alugamos um galpāo que era uma boate gay em processo de falência, um amigo fez o flyer recortando letras do jornal, panfletamos em todo canto até em show de metal, a festa explodiu de gente e foi incrível, apesar dos perrengues de lidar com a produção, skinheads, punks oi e nossa imaturidade profissional. Já com o meu projeto chamado The Porn Queen Rocks, do qual faziam parte os amigos: Davidson The Porn, Eric Queen e o Kleber Rocker. A gente misturava tudo que gostávamos com live vocais, guitarras e beats de funk. Não éramos lá muito bons, mas diferentes pra época, eu creio.
Lá por 2011, entrei para o Nü Beat com o Ogunda-o, Ezy e o Tomás Serafim. Fazíamos um programa de rádio que foi ao ar todos os sábados à noite durante alguns bons anos. Logo em seguida, quando já tocava na cidade regularmente, com residência em alguns espaços, fui convidado pelo Weirdo e Gustavo – propetário do Velvet – a fazer a Let’s Dance.
TUNTISTUN: Diz para gente 5 músicas que te marcaram no início da sua descoberta na música eletrônica?
Afrika Baambaataa & The Soulsonic: Afrika Bambaataa & The Soulsonic- Planet Rock:
Boys Noize- The Bomb:
Daft Punk- One More Time:
DJ Marky & XRS- LK:
New Order- Bizarre Love Triangle:
TUNTISTUN: Você já participou e idealizou vários rolês na cidade, inclusive o sucesso da Vapø_r deve ser claramente uma recompensa de tanta dedicação, mas antes de chegar na Vapø_r, teve muita batalha e acredito que histórias incríveis. Vamos lembrar das grandes histórias que rolaram na Let ‘s Dance?
A Let’s Dance durou 6 anos, sempre aos domingos de 22h a 4h, às vezes 5h da matina! Passaram por lá mais de 100 artistas. Recebemos tantas e tantos artistas incríveis de diferentes histórias e jornadas que me enche o coração lembrar desta época. Tivemos mais de 160 edições, muitas foram na base de tequilas, Jack Daniel’s e cervejas pra aguentar. Afinal já pensou TODO domingo na hora do fantástico você está ligando o som de novo pra tocar e produzir uma rave? Tivemos noites em que acreditávamos que não teríamos ninguém na festa e do nada chegava um ônibus de turismo com 60 pessoas que fritavam por horas conosco. Noites em que a 102 norte estava alagada pela chuva e as pessoas se acumulavam do outro lado da rua esperando uma hora pra entrar na festa.
Eu e o Weirdo sempre tivemos o mesmo foco na LD ou pelo menos nos entendíamos muito bem quanto aos nossos gostos e curadoria. Quando veio o CCCP, algumas coisas se tornaram mais fáceis e conseguimos ter uma unidade bacana. Quem esteve presente na primeira noite com o Mau Mau sabe bem o que estou dizendo: mais de 300 pessoas dentro do Velvet pub, a fila dando volta no bloco num domingo à noite? Algo único que só nós fomos capazes de repetir tantas vezes. Ali investimos nosso tempo e saúde pra construir àquelas noites de coração. Valeu a pena, sabe? Afinal foram 6 fucking anos fervendo nossa cidade enquanto muita gente dormia.
TUNTISTUN: Conta um pouco da história do surgimento do coletivo Vapø_r, porque ele surgiu, qual é o ideal e como foi o início de tudo? Quem toca esse rolê com você?
A Vapø_r surgiu após a Let’s Dance acabar. Fiquei deprimido por um tempo. Depois da LD, o CCCP iniciou novos projetos incríveis, pude participar da maioria. Porém sentia falta do sentimento que a LD trazia, aquele quentinho no coração, sabe? Então decidi criar uma nova festa. Ela passou meses em processo de desenvolvimento (nome, curadoria, local pra realizar, ID visual, como tornar rentável), o mais demorado foi o nome que veio de um clássico do hardcore chamado “E-vapor-8”.
O fervo é feito por muitas pessoas e parte, desde um papo no grupo de quem apoia a Vapø_r, até a quem mete a mão na massa. No momento, a Vapø_r tem a produção da Preta, Keyler0, Weirdo e minha mais ativamente. Temos o DJ Ahmed também que nos auxiliou bastante no passado, mas hoje segue apenas se apresentando quando possível. Alguns dos ideais que a Vapø_r leva: gerar empregos aos que vivem da cena, desde a pessoa que limpa o chão até alguém que vai estar em cima do palco. Eu acredito que uma cena é viva quando as pessoas podem viver dela além do fim de semana. Dar espaço e criar espaços plurais para artistas e sempre tentar valorizar o máximo possível essas pessoas.
Nesse instante estamos caminhando para os 5 anos de vida com MUITAS surpresas e sonhos sendo concretizados, para nós e para o DF. Aguardem. ☺
Mas já posso adiantar que teremos a Galeria FERVO 2ªed.
Altern 8- E-vapor-8:
TUNTISTUN: Tem algum(a) DJ da nova geração que você acha que merece a nossa atenção?
Não consigo responder essa pergunta falando somente de DJs. A criatividade pra uma cena existir vai além do DJ. Entāo vou citar pessoas que vejo como parte do futuro da cena.
A Preta tem tudo para ser uma DJ, curadora e produtora incrível. Ela tem se mostrado a cada oportunidade uma pessoa que fará a diferença em nossa cidade. As meninas da Bruta trazem um som forte e conteúdos importantes, mostrando a importância da saúde mental além do som. A Fernanda Coutinho, Pedro Lacerda, Lucas Las Casas e o Victor Diniz trazem um olhar incrível sobre o universo raver, onde a fotografia passa a ter sentimentos. O Broken, Matheus Cruz e o Allan Blue são produtores fervidos que tem me impressionado. Na iluminação, a Lores a cada oportunidade que tivemos juntos transformou ambientes em viagens visuais surreais. A ANRMS tem uma criatividade monstra na criação de artes e ID visuais. A Giograng e a Leriss estão arrasando mais a cada set que ouvi.
TUNTISTUN: E o que você curte além de música, tem mais algum assunto que te apaixona?
Adoro assistir novelas e ver séries. Sem essas paixões acho que a pandemia teria acabado comigo de alguma forma.
TUNTISTUN: Pode indicar 5 músicas mais recentes que você tem curtido?
Four Tet – Baby:
Lauren Flax – it’s Ours (Jimmy Edgar remix)
Late Nite ‘DUB’Addict – Funktion One
Perrelli – Fim de Um Tempo Triste
Rassan – U Don’t Know
TUNTISTUN: O que você acha da energia da pista de Brasília?
Nesses mais de 10 anos de trabalho na noite, 9 anos de Weird Rockers, 6 anos de Let’s Dance, 7 anos de CCCParty, 4 de Vapø_r, só posso dizer que a pista de Brasília é incrível e única! As pessoas se jogam de cabeça aberta. Nāo me lembro de trazer algum artista pra cidade e ele(a) nāo nos elogiar, lembrando que são inúmeros nomes. Nossa cultura de dançar e ir com vontade de sentir o groove na pista foi bem desenvolvida por aqui durante todas as gerações da cidade. Fico feliz de viajar e tocar pelo Brasil, mas praticamente em toda tour, quando chega a hora da edição de BSB, ficamos pra lá de felizes.