Ao final do texto anterior, que falo do início da música eletrônica em Brasília, eu comentei sobre o Marconi, que foi quem me apresentou esse novo estilo de música. Conheci o Marconi quando eu tinha 8 ou 9 anos. Ele era muito amigo dos meus irmãos e sempre foi uma pessoa magnética, carismática, daquelas que todos gostam de ter por perto. Os momentos mais marcantes eram quando ele chegava nas nossas festinhas, que fazíamos no salão de festas do bloco, e mudava o astral da festa colocando umas músicas esquisitas e fazendo umas danças malucas. Só ele dançava e isso quase acabava com as nossas festas. Ele chegava com umas fitas k7, provavelmente gravadas pelo Danny, colocava no aparelho de som e começava a dançar, e ele dançava muito. Em 1988 eu tinha 14 anos e achava muito estranha aquela música, mas o Marconi, eu achava o máximo. Outra coisa que ele gostava de fazer era colocar o som bem alto na varanda de sua casa e ficar dançando, animando, fazendo uma baita festa.
Em 1991 algo estava mudando em mim, a música que eu escutava já não me tocava mais, e eu estava em busca de algo novo. Foi um ano que fiz novas amizades e estava fazendo novas descobertas musicais. Antes de me apresentar no alistamento militar, cortei o cabelo e naquele momento senti que rompi com o Rock. Um dia eu fiquei olhando detalhadamente meus discos e percebi que alguma coisa estava errada, pois todas as músicas que eu escutava eram antigas, não tinha nenhuma recente, a maioria eram músicas da década de 70/80. Eu na adolescência escutei muito Rock, acabei construindo uma bagagem no estilo. Fui aos shows das bandas de Brasília, frequentava as festas e bares da cidade e fui ao Rock in Rio 1, em 1985 e ao Rock in Rio 2, em 1990. Acho que a última banda de Rock que eu gostei e fui ao show foi a Banda Oz, de Brasília, que era a banda da juventude de Marcelo Martins, o Nego Moçambique. Alguns anos depois tivemos um reencontro e nossas aspirações musicais agora são a música eletrônica.
Em um verão com minha família, tivemos a sorte de ter o Marconi como nosso convidado. Ali nos aproximamos mais e comecei a me interessar por aquelas músicas estranhas que ele escutava. Um dia ele me emprestou uma Fita k-7 para eu fazer uma cópia em casa. Lembro bem do momento que ele ia me entregar a fita, que ele quebra o lacre para ela não ser mais gravada em cima. Todos que escutam um set mixado sabem a desgraça que é ter um “furo” desse na gravação, principalmente na música eletrônica, onde essas falhas no som cortam a vibe. Essa fita tinha um set mixado que foi gravado pelo Danny. Nesse set várias músicas me conquistaram. Eu finalmente escutava uma música que refletia exatamente a realidade que eu imaginava pra mim, uma música da minha época. A primeira sequência de músicas começava com Cubic 22 – Night in Motion
Outra música incrível desse set foi do projeto Altern 8, que contei a história de quando eles vieram ao Brasil, em 1993. Nessa fita k7 ainda tinha o clássico do T -99, e uma música do The Prodigy. Foram essas as primeiras músicas que mudaram minha cabeça.
Nessa época que comecei a escutar as fitas k7 emprestadas, eu só escutava música no fone de ouvido, não tinha tido a experiência de ouvi-la em uma pista de dança. Escutar música eletrônica no fone de ouvido é importante para se prestar atenção nos mínimos detalhes, ainda mais para quem não podia escutá-la em um som alto e potente, como em uma pista. A primeira festa eletrônica que fui, foi a We are Back na Oficina Perdiz, espaço onde além de funcionar uma oficina mecânica, tinha apresentações teatrais e também foi palco de muitas festas.
Por conta da minha amizade com o Marconi acabei conhecendo o André, e logo depois, o Pedro. Lembro que na festa We are Back conversei um tempo com o Pedro e com Gualberto, que era um amigo e frequentador assíduo das festas, e que as vezes, fazia a função de LJ (Light Jockey) em eventos de música eletrônica. Foi a primeira vez que eu ouvi algumas das músicas que eu escutava no meu Walkman, em uma pista.
As festas eram bem esporádicas, e quase sempre com a mesma galera participando, muitos eram capturados na noite mesmo, em lugares como a 109 sul, principalmente no Bar Beirute, e outros tantos eram amigos do Pedro e do André. O investimento na produção ainda era pequeno, estavam no início da construção de uma cena e como eles trabalhavam e estudavam muito não conseguiam organizar as festas frequentemente. A segunda festa que participei, a Mentok 1, foi bem diferente. Com mais pessoas ajudando na produção, o investimento foi maior, e aqui aparece uma pessoa importante que tempos depois também vai virar DJ e fazer sua história na capital, Marcelo Galo. Logo na entrada da festa percebi que o público tinha aumentado muito em relação a festa anterior, e a estrutura também: mais som, luzes, máquina de fumaça, estroboscópio, decoração, tudo estava maior. A festa, que foi dentro de um Hangar de Ultra-Leve, com toda essa estrutura montada, tocando uma música inovadora para a maioria das pessoas, dava a real impressão de ser uma grande rave. Para mim esse foi o primeiro sinal de que novos tempos se aproximavam, que a cidade poderia aceitar bem essa música. Eu, e quase todo o público presente na festa, ficamos muito entusiasmados com essa nova atmosfera que estávamos vivendo. Nós, sem nos darmos conta, participamos de uma novidade mundial que estava nascendo. O que mais me encantou foi observar a troca de energia entre DJ com a música e o público, uma coisa fantástica. Lembro que foi a primeira festa que me empolguei e gritei na pista! Foi minha virada de chave.
Toda essa experiência nova que eu estava vivendo mexeu comigo, e comecei a sentir a energia de algo novo, diferente, e aquilo ficou na minha cabeça. Enquanto isso, em agosto de 1992, abre em São Paulo um dos lugares mais emblemáticos da cultura Club do Brasil, o local que veio a “substituir” o Nation (fechado em 1991) o Sra. Krawitz, onde os DJs Renato Lopes e Maurício (que depois viraria MauMau) tocavam como residentes.
No fim de 1992 eu faço uma viagem com Pedro, André e Marconi para ir, finalmente, ao Sra. Krawitz, o primeiro templo da música eletrônica underground de SP, já que no Nation e no Massivo, casas que o DJ Mauro Borges tocou, a música Pop ainda tinha vez. O Krawitz já estava com fama nacional de ser a casa mais legal do momento, onde as coisas mais absurdas aconteciam. Logo na noite de abertura, programada para uma sexta feira, a casa não ficou pronta e não pode abrir. Abriu no sábado, em cima da hora, com muita festa e tinta fresca na roupa de todo mundo. Não é qualquer casa noturna que no fim de semana de inauguração não consegue abrir na data programada, e no dia seguinte, quando finalmente abre, solta tinta nas roupas das pessoas, e mesmo assim, é sucesso. Eu estava louco para conhecer esse lugar, de tantas histórias que eu já tinha ouvido, cada uma mais absurda que a outra, como a noite em que um porco ficou rondando dentro da festa por um bom tempo. Nós tínhamos marcado de nos encontrar na casa de um primo do Pedro, o Marcelo Gomes, e de lá, a gente ia pro Krawtiz. A casa dele era relativamente perto do Club, fomos a pé e chegamos em uns 20 min andando.
A rua Fortunato, onde ficava a casa noturna, no Bairro de Santa Cecília, era bem pequena. Era uma rua de pequenos sobrados e algumas casas baixas na região central de São Paulo. A primeira impressão que tive, e que estranhei, era a quantidade de carros que estavam na porta, muito poucos. Pensei que devia estar cedo ainda e talvez vazio, mas ja tinha uma pequena fila para entrar. Depois de enfrentar essa pequena fila entramos onde duas pessoas de hostess, que eram ícones da noite de SP, Jonny Luxo e Kátia Miranda, recebiam as pessoas. A noite já estava lotada e quando entro já sinto algo diferente. O Krawitz funcionava dentro de um sobrado de 2 andares, onde para entrar tinha que subir uma escada que dava para um mezanino onde você já podia ver a pista abaixo e a cabine de DJ ao lado. Para chegar na pista de dança era necessário descer uma outra escada que dava acesso novamente ao térreo, e de lá, se virasse para direita você acessava o bar e o banheiro, e se virasse para esquerda você acessava a pista. Quando cheguei na pista a alegria foi imensa, foi, sem dúvida, uma paixão imediata.
Fomos na sexta e no sábado, Renato Lopes sempre abria de 23:00 até as 3:30 e o Mau Mau entrava as 3:30 e ia até umas 07:00. Era uma combinação perfeita. E ver um DJ experiente por 3 horas, podendo construir de verdade um set, pois tinha tempo pra isso, quando tem consistência, variedade e bagagem musical, fica perfeito. Eu comecei a perceber a condução dos DJs, como eles criavam climas e momentos únicos com as músicas mixadas. Chegamos cedo e só fomos embora de manhã, quando a última música foi tocada. Voltamos pra casa novamente a pé e na cabeça ficaram as musicas que eu tinha escutado a noite toda. As que eu voltei pra casa “cantando” foram:
Minha vida tinha dado uma balançada com essa ida para o Krawitz e eu, na volta para Brasília, já ficava pensando se seria possível eu ir morar em São Paulo. Eu tinha sido definitivamente fisgado pela música, pela cultura Club e tudo isso graças aos DJs que eu acabei encontrando nesse meu início. Pedro e André, em Brasília, abriram minha cabeça para os novos sons e Renato Lopes e Mau Mau mostraram como conduzir uma pista perfeitamente.
Menos de 6 meses depois dessa ida a São Paulo eu estava indo definitivamente, ou pelo menos eu achava isso. Indo sozinho, sem o suporte dos amigos que me mostraram a cena paulista na primeira vez, não seria fácil, mas, graças as conexões, dei sorte. Meus 3 amigos, Pedro, André e Marconi eram muito bem vistos em São Paulo. Eles já conheciam desde a época do Nation principalmente duas pessoas chave, a Gláucia ++, na época barwoman do Krawitz e Renato Lopes, um dos DJs.
Com as portas abertas pela Gláucia eu logo fico amigo de todo staff da casa. E ali vivi todas as sextas e sábados em diante, até o fechamento do Krawitz. Eu pude ver como espectador inúmeras loucuras que aconteceram lá. Para citar as mais famosas, a Pool Party que eles promoveram enchendo a pista de água ate a cintura das pessoas, que foram de trajes de banho. Ficou tão surreal que pra completar a experiência você tinha que ter cuidado pra não tomar choque no corrimão da escada. Ou a noite em que eles colocaram um monte de galinhas coloridas em um galinheiro na porta. Como esquecer da noite que o Club todo estava com saquinhos de pé de galinha cheios de água grudados na parede e que no fim da noite uma guerra com esses sacos aconteceu para desespero dos seguranças. Uma outra história, em uma viagem de um pessoal de Brasília para SP, marcamos de nos encontrar no Krawitz, e no final da noite a gente procura uma das meninas que foi com o grupo, e somente quando acabou tudo e as luzes foram acessas que a encontramos dormindo no palco com os seguranças perguntando se ela estava bem. Ela tinha perdido a saia.
Em pouco tempo eu, que sempre fui muito ligado à música, sempre comprei meus discos de vinil, queria assumir aquela posição de DJ também. Logo fui atrás de um curso, e fiz o meu na escola Fieldzz, do DJ Iraí Campos, dono da DJ Shopping, loja muito importante na época. Meu instrutor foi o fantástico DJ Akeen, famoso por suas incríveis performances e por ser fã do Michael Jackson. Saí de lá sabendo como deveria fazer uma mixagem da forma correta mas ainda sem o mais importante, que só vem com o tempo, que é a experiência e a bagagem.
Meu primeiro disco de vinil de música eletrônica comprado foi inesquecível. Comprei nas lojas que existiam nas galerias do centro de SP. O disco além de ser fenomenal tocava ao contrário. Eu tinha que colocar a agulha no final e o disco voltava para o início. Somente anos depois, eu vim a descobrir como o disco era historicamente importante. Quando comprei não fazia nem idéia de quem era o artista, pois não tinha nenhum nome escrito e nenhuma informação clara. Hoje graças a internet eu sei que era do selo Hard Wax do Robert Hood, outro pioneiro de Detroit, no segundo lançamento do label, com H-Bomb (Jeff Mills) – Radar .
A minha primeira leva de discos comprados tinham, por razões óbvias, muitas músicas que tocavam no Sra. Krawitz. Foi a época que conheci as lojas de disco do centro da cidade mais a fundo. Estava fazendo o meu curso de DJ e todo dinheiro que aparecia era pra comprar disco. Nas lojas do centro da cidade trabalhavam DJs que pouco tempo depois explodiram em São Paulo, como DJ Marky e DJ Julião, que na época tocavam na Sound Factory, na zona leste de SP.
Esse período foi a complementação da minha formação como DJ, se no início eu tinha como exemplo Pedro e André pela criatividade, pelo conhecimento musical e pelo entusiasmo, agora me aproximava de um circuito mais profissional, com uma geração de DJs que são parte da história da música eletrônica brasileira, os já citados Renato Lopes e MauMau. Em São Paulo me aproximei também de outro talento que era residente do Columbia, uma outra casa noturna e histórica de SP, o DJ Gil Bárbara.
Iniciei meu curso de DJ no fim de 1993, e logo no início de 1994 eu tenho a minha primeira chance de tocar. O Sra. Krawitz, no carnaval, resolve fazer uma noite de domingo especial e convoca alguns DJs, e eu sou um deles. Recuperei esse flyer com outro DJ muito importante da história de SP, o Eduardo Corelli.
Claro que eu orgulhosamente abri a festa. Pela hora tinham poucas pessoas na pista, mas a sensação de estar tocando na cabine que eu me inspirei a virar de DJ, foi indescritível. E graças a imensa generosidade do DJ Renato Lopes que, no auge da festa, com a pista lotada, me pergunta se eu queria virar uma música naquela hora, ou seja mixar uma música com a casa lotada. Nem acreditei que aquilo estava acontecendo e na minha cabeça eu não podia errar. Para garantir a pista toquei um clássico do Kraftwerk, Numbers. (Escrevo esse texto na semana que Florian Schneider, da banda, faleceu. RIP )
O Sra. Krawitz durou ate junho de 1994, e após sua abertura a cidade de São Paulo viu o surgimento de 14 clubs voltados a música eletrônica sendo abertos nos anos seguintes, mostrando o poder de influência que a casa teve na cidade e no Brasil. No Club o DJ tinha tempo para desenvolver um set, ele precisava ter muitos discos, e nessa época os estilos de música ainda não estavam muito segmentados, o DJ tocava vários estilos na mesma noite. Eles tocavam no Krawitz as musicas de, 4 Hero – Mr. Kirk’s nightmare, Dsr – Babaloo, Massive Attack – Unfinished Sympathy, Rum DMC – Ooh whatcha gonna do, e MauMau certamente foi o primeiro cara a tocar Jamiroquai – When You Gonna Learn no Brasil.
O DJ que tocava nessa época precisava ter muita variedade e isso ajudava a construir a bagagem musical. Após o fechamento do Krawitz, muitos Clubbers ficaram sem uma casa noturna de referência, até que meses depois o Columbia abre seu porão para uma festa diferente. Era uma festa que começaria as 4 da manhã, seria o primeiro After Hours do Brasil e tinha o nome de Velvet Underground, durou 2 finais de semana, quando um novo promoter assumiu, o Pil Marques. Pil era um antigo frequentador do Krawitz, e levou o DJ Mau Mau para ser o residente, e mudou o nome da noite para Hell’s Club. Nasce o primeiro Club dedicado ao Techno no Brasil. Conheça algumas músicas que fizeram a história do Hell’s.
Com tudo fervilhando, e eu querendo efetivamente tocar, decido voltar para Brasília. São Paulo, mesmo com esse início promissor não seria fácil pra mim. Eu tinha o desejo de criar um movimento parecido com esse que vivi em SP na minha cidade, Brasília. Mesmo cheio de dúvidas de como seria esse retorno, decidi voltar.
Volto para uma cidade que ainda lutava muito para sustentar uma noite eletrônica, mas ela já tava mudada, já tinha mais Djs atuantes, mais espaços, e mais público. O destaque para essa época vai principalmente para o DJ Marcelo Galo e o DJ Fran que começaram a fazer varias festas formando outros núcleos de adeptos. Tivemos o Bizarre, o Dreams, a Nova Lapa e o Star Night como os principais lugares de festa na cidade.
Desde que eu voltei de São Paulo eu já estava interessado em começar a tocar. Nessa época o acesso ao disco importado era muito complicado, mas eu tinha feito algumas conexões com as lojas de disco e, principalmente, com o maior fornecedor de discos para os DJs de SP. Antes do Real virar nossa moeda e trazer estabilidade monetária, um DJ novato quando comprava disco com o fornecedor, precisava ficar atento caso recebesse uma ligação informando a chegada da encomenda. Ele mandava fazer um depósito urgente pois o valor precisava ser passado na hora, observando a cotação do dólar no dia. Lembro que a maioria dos Singles em vinil de 12″ se fossem americanos tinha o preço de U$ 10,50 e se fossem europeus custavam U$ 13,50 dólares.
Em 1995 eu estava decidido a entrar de vez no circuito da noite de Brasília, achava que poderia ajudar tendo a experiência que eu tinha vivido. Pedro e André sempre foram minha conexão musical e inspiração em Brasília, eles fizeram coisas incríveis em uma cidade distante de tanta informação, em época sem acesso a internet, sem equipamentos profissionais, mas com uma coisa muito importante, a criatividade. Nós continuamos mantendo uma relação muito boa mesmo enquanto eu estive em SP. Gastei fortunas em interurbanos colocando musica para o André ouvir pelo telefone. Eu tinha conquistado o respeito deles e tínhamos muita afinidade musical. Vou mostrar algumas coisas que eles me apresentaram. Depois do Hardcore de 1991, que eu mostrei no início, fomos para o que chamávamos de Baby Warp, a fase de ouro do início do label inglês.
Foi com o Pedro e André que descobri novas fronteiras sonoras, e posteriormente numa nova fase da Warp, entrei no IDM (Intelligent Dance Music) que se consolidou como um novo estilo de música.
Minhas primeiras tocadas em Brasília, na minha volta de São Paulo aconteceram no Subsolo do Atlas da 314 norte. Esse lugar nos finais de semana começava a juntar mais adeptos e pessoas que estavam decidindo ir mais a fundo na música eletrônica.
No início de 1995 eu ia me mudar da quadra que eu tinha crescido e feito minhas amizades mais importantes, e muitos deles consegui trazer para a música eletrônica. Nessa quadra tinha o Marconi, o Léo Cinelli e seus irmãos, Fabrício e Bição, Ernani que uma época tocou como DJ Vortex e produziu a festa Temprano, Marlize que foi hostess do Wlöd, e até o DJ Drezin, da festa Mistura Fina, morávamos todos na mesma quadra. São meus amigos desde meus 7 anos de idade. Tinha chegado a hora de eu sair dessa quadra, a hora de ir para a Asa Norte. Só que para minha despedida programei uma baita festa no apartamento que já estava todo vazio. Foi loucura total com a polícia chegando na madrugada tentando acabar com aquilo. Outro fruto gerado nessa quadra, que talvez para o azar, ou sorte dela, morava embaixo de mim, e que certamente teve sua infância marcada pela música que escutava vindo de cima, foi a Camila Mota, que é esposa do Juarez Petrillo, o DJ Swarup.
No dia 4 de novembro de 1995 foi a primeira vez que eu participei, junto de Pedro e André, em uma produção de festa. Foi a primeira vez que eu ia produzir um evento com eles. Era minha chance. Eles tinham deixado de ser Pedro e André e viraram Cnun (André) e Sunrise 1 (Pedro) e eu precisava deixar de ser o Gui. Era uma época que não fazia o menor sentido ter um nome comum. Estávamos trazendo um contexto novo, uma música nova, e como ninguém pensava em nada sério profissionalmente o nome poderia ser inventado, estranho, mutante, qualquer coisa. Nessa época era mais fácil tomarmos latadas de cerveja na cara por tocar essa música, do que pensar em ganhar dinheiro. E numa conversa com o André sobre minha nova identidade, ele comentou que meu som tinha muitos elementos de Clonks que era o nome de uma música do Sweet Exorcist da época do que chamávamos de Baby Warp. Da mistura de Clonk com Gui, meu apelido, nasce Oblongui.
Participei de toda a concepção da festa, aprendendo como se montava um conceito, uma proposta visual, alguma performance, aluguel de som, escolha de músicas, tudo o que uma festa precisa. A festa foi tão incrível, com muitos acontecimentos preparados, e outros completamente aleatórios, que nos trouxeram uma mescla de sentimentos. A primeira coisa que vale ser comentada é que a casa onde realizamos a festa, era bem no início do lago norte, toda de vidro, com piso de madeira, e ainda tinha um mezanino, onde colocamos a cabine. Do lado de fora montamos um bar ao lado da piscina.
Contratamos um performer para fazer uma aparição surpresa na festa, seu nome era Paulucci. Ele fez algumas apresentações com fogo na piscina e, em determinado momento, ele entra na pista de dança com um fígado de boi enrolado no corpo e causa uma histeria coletiva. Essa festa foi muito marcante pra cidade e tem uma música que ficou na minha memória de quando eu toquei e todo mundo foi a loucura. Foi Car Thief do Slam.
Uma festa tão perfeita só poderia terminar com um final apoteótico. Não sabemos exatamente o que aconteceu, mas às 5 horas da manhã toda a luz do lago norte acaba, é um choque de início, mas como a festa já tinha sido incrível e as pessoas estavam tão felizes que foram embora tranquilamente. Nunca saberemos se alguém ficou revoltado com a festa e fez algo para derrubar a luz, e se fez, apagou todo lago norte, ou se foi apenas coincidência. No dia seguinte a moça que foi contratada para arrumar a casa me liga, após ter terminado o serviço e me fala que arrumou tudo na casa. O único comentário que ela fez foi que estranhou que achou no banheiro um pedaço de fígado de boi no lugar do papel higiénico.
Eu estava decidido a contribuir na cidade com a cultura DJ. Eu sabia e admirava todo o rolê que Pedro e André tinham trazido pra cidade, em conceito, em concepção de evento, em formatação de festa, em curadoria musical, e chegava a hora de eu também contribuir. Eu queria trazer para mais perto da gente a cultura do Disck Jockey.
A realidade dos equipamentos que a gente usava até então, não era das melhores. Como tudo estava crescendo, os fornecedores ficando mais profissionais, comecei a exigir caixa de retorno para quando fôssemos tocar, assim como os toca discos Technics Mk2, que são os preferidos dos DJs do mundo.
No começo do ano de 1996, recebo uma proposta de um cara que tinha um pouco de dinheiro e queria investir em um casa noturna, e ele era tio da minha namorada na época. Suas filhas e sobrinhas iam nas nossas festas, e ele achou que seria um bom negócio abrir uma casa noturna, e perguntou se eu topava tocar essa idéia. Eu sem pensar direito disse que sim, que topava. Começaria ali a história do primeiro espaço dedicado exclusivamente a Música Eletrônica de Brasília, o Wlöd Club.
Continua….